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Trabalhamos embarcadas, offshore, dentro d’água, como queiram. As palavras para explicar essa maneira de ganhar a vida, ou ganhar o sagrado dinheiro para viver a vida, tem muitos nomes. Mas, o importante é o que se ganha na convivência. Neste mundo muito diferente, temos o privilégio da intimidade quando descobrimos a beleza no interior dos seres mais incríveis. Verdadeiros presentes em palavras pois é o que podemos aqui compartilhar. Pérolas que não vão adornar o corpo mas com certeza vão fazer crescer o valor da alma de cada uma de nós. Se nem tudo que se mostra é belo, não importa. Se percebermos o equilíbrio, vai ficar tudo bem!

24 março, 2022

Você sabe trocar o pneu do seu carro?

 



  O "grande barato" da vida é aceitar o equilíbrio, entender como funciona, reconhecê-lo como perfeição.
   Encarar o bem e o mal, a luz e a sombra como partes que integram o todo, como sol e lua. Extremamente necessários ao nosso desenvolvimento e sobrevivência, e ainda assim, opostos.
   O fato é que não somos educados para entender o lado obscuro, as doenças, os contra tempos e os reveses no dia-a-dia.
   Temos um carro com um step mas jamais pensamos que vamos usá-lo. E quando fura um pneu, a tragédia se instala! É assim também dentro de nós!
   Nossa mente carrega todo o equipamento para "trocar nosso pneu furado", mas ignoramos como colocar o macaco no lugar certo para levantar o carro. Simplesmente não queremos aprender a lidar com esses aborrecimentos e ignoramos as noções básicas de segurança, deixando para outros (a seguradora) a incômoda - e lucrativa - tarefa de resolver para nós!
   Ainda assim, às vezes temos o plano B (Boas Almas), que passam no momento certo e nos ajudam. Mas, como resolver a doença, o aborrecimento com o filho, uma conta para pagar? Provavelmente o plano B não vai acontecer e um seguro não irá resolver.
   Precisamos ler o manual que vem no carro e nos preparar para um possível prego no caminho. Desta forma, estamos cientes que o mundo gira em equilíbrio perfeito e podemos sim, encarar essas formas de vida emocionalmente preparados. Gritar, chorar, culpar alguém e chutar o carro não irá resolver, com certeza!
   Quando fui calibrar os pneus do meu carro, o atendente do posto me perguntou: E o step, senhora, tá calibrado? - Pensei, caramba! Ele existe, sim! E eu aqui, ignorando completamente a possibilidade da minha viagem perfeita. Mas aí que está! A perfeição existe na ambivalência, na dualidade. E é por isso que abri a mala do carro e ele, gentilmente, calibrou o step - que não estava em condições de substituir os outros!
   Prestem atenção nas imperfeições que sempre te levarão à revelação do seu próprio ser. Conheça sua sombra, ela que revela onde está sua luz, e as duas unidas, equilibradas, trarão evolução. E perceba que as duas fazem parte do mesmo ser, que é você. Não ignore nenhuma de suas partes.
   Aprenda a trocar o pneu do seu carro. Aprenda a trocar lágrimas por sorrisos. Aprenda a trocar maus dias por bons dias. O peso do aborrecimento é a incapacidade de lidar com suas próprias ferramentas.
   Prepare-se para sua viagem. Olhe sua vida com agradecimento porque tudo faz parte do todo, onde o amor permeia tudo!
   

19 março, 2022

Embarcando na Pandemia


 

     Nesses últimos anos o que parecia ser muito difícil para nós, que embarcamos em unidades de produção de petróleo, ficou ainda mais difícil. Aquela escala antiga de 14 x 14, que na verdade era 14 x 12 (deixa eu fazer um parênteses aqui para explicar essa situação) era bom e nós não sabíamos!

     O regime offshore nos submete a um embarque de 14 dias a bordo, onde ficamos embarcados, trabalhando 12 horas por dia com mais 12 horas de sobreaviso. Isso significa que se tocar um alarme ou o trabalho necessitar, temos que atender a demanda. Aqui não existem shoppings, domingos ou feriados. A internet é muito ruim, o ruído nos faz usar protetor auricular e o cheiro de gás normalmente entra pela ventilação da acomodação e nos acorda com uma sensação de dor de cabeça e náusea.
É... e vocês aí pensando que nós velejamos! (risos)

     Os outros 14 dias são da nossa “folga”. Nesses dias nós temos que recuperar o tempo em terra para consultas, exames, visitas sociais, resolver problemas que ficaram nos esperando e a demanda da família. Onde, normalmente, só queremos nos jogar na cama, encher a cara de cerveja ou pegar o carro e desaparecer no mundo... é bem assim!

     Só que esses 14 dias acabam virando 12. Um dia de viagem para vir para o trabalho e outro dia para voltar para casa. Há muitos colegas que desembarcam de manhã e chegam em casa meia noite. E lá se vai o nosso primeiro dia de “folga” no deslocamento – com congestionamentos, voos atrasados, e algumas vezes uma chuva ou falta de aeronaves que atrasam ou adiam nosso desembarque. Isso tudo faz parte do nosso pacote!

     Parece que estou reclamando? Ah, só estou relatando fatos. A ideia romantizada daqueles que trabalham offshore está longe de ser empática com a realidade. As fotos do por do sol, do nascer do sol, da paisagem que é diferente todos os dias, dão uma ideia de paraíso. Sim, o mar, a natureza, esse planeta maravilhoso é um paraíso aos olhos, mas não para o físico ou o mental.

     Retomando, quando chegou a fatídica pandemia o horror emocional começou. Quarentenas de 15 dias em hotéis, sem poder sair ou ver ninguém que baixaram para 7 dias, 5, 4, 1, voltou para 4 e agora serão 2. Essa inconstância nas escalas e na nossa vida nos tornaram mais escravos do trabalho – da empresa – do estilo gestor de ser, ou não ser. Se antes éramos “recursos” agora somos números, de fato!

     É impossível planejar sua vida. É impossível prever ou querer fazer algo na “folga”. Tudo vai depender do que vai acontecer com sua vida profissional que se tornou o centro de tudo. Afinal, sem emprego, sem dinheiro, como sustentar a vida lá fora?

     Somos escravos em um regime velado que é ditado por organizações (humanas) que sequer tem a noção do que fazemos ou como vivemos aqui. E para você que está lendo isso, pode parecer muito mimimi, mas aqui, quem escreve, é uma pessoa que VIVE neste mundo há mais de 18 anos. E agora, independente de quão capaz eu sou, do quanto gosto de estar e trabalhar aqui, sinto que suportar essas exigências desumanas não é mais possível.

     A conclusão é que não trabalhamos para viver, mas vivemos para trabalhar. E se levarmos em consideração a origem da palavra trabalho, vamos ver que cada vez mais teremos que lançar mão de ansiolíticos para continuar vivendo com um mínimo de qualidade.

     Trabalho vem de tripalium, um instrumento de tortura que tem três estacas de madeira afiadas. Trabalhar, significada “ser torturado”. Que incrível! Se tivéssemos noção da origem das palavras que usamos no nosso dia a dia, quem sabe faríamos algo para mudar.

     Enfim, torcemos agora para que a quarentena no hotel diminua ainda mais, porque cada dia que passamos fora é como se removessem alguns grilhões da nossa alma.


Curiosos