Navegando...

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Trabalhamos embarcadas, offshore, dentro d’água, como queiram. As palavras para explicar essa maneira de ganhar a vida, ou ganhar o sagrado dinheiro para viver a vida, tem muitos nomes. Mas, o importante é o que se ganha na convivência. Neste mundo muito diferente, temos o privilégio da intimidade quando descobrimos a beleza no interior dos seres mais incríveis. Verdadeiros presentes em palavras pois é o que podemos aqui compartilhar. Pérolas que não vão adornar o corpo mas com certeza vão fazer crescer o valor da alma de cada uma de nós. Se nem tudo que se mostra é belo, não importa. Se percebermos o equilíbrio, vai ficar tudo bem!

16 agosto, 2011

Sobre a Vida


Pandora me escreveu e me perguntou por que falo tanto sobre a morte. É uma longa história...
Vi um filme uma vez, em uma das cenas, uma menina pintava um quadro enquanto uma linda moça a ensinava sobre os tons. Com o olhar crítico, agudo para sua jovem idade, ela disse à menina: “Cuidado com as sombras! São elas que vão intensificar a luz!”
Da mesma forma eu penso – como poderemos valorizar a vida se não pela morte?
No simples ato de respirar, inconsciente, estamos ligados a tudo. Ao sol que nos aquece, ao vento que nos traz aromas, nas flores que encantam nossa retina, nos sons que inundam nossos sentidos... Notas musicais o tempo todo!
Assim é a música da vida. E dançamos conforme vamos compondo na partitura do destino com nossas escolhas.
Vamos cantando, encantando e desencantando os outros. Da mesma forma somos suscetíveis as nuances da paixão e do amor, cicatrizamos o coração, e preenchemos nossa história com belas e feras.
Não precisamos falar sobre a vida. Melhor senti-la. Melhor vivê-la sem medo. Mesmo assim queremos saber nas runas, no tarô, nos búzios, como vai ser a vida!
A vida é verdadeiramente bela! Nós que às vezes não conseguimos ver a beleza, sentir os tons, pintar as sombras e fazer acender a luz! Ficamos agarrados à sensação de fim, sem vontade, sem perspectiva, ligados no automático.
Mesmo assim a vida continua fluindo através de um inesgotável derrame de energia levando-nos a girar por um caleidoscópio tão sutil que só percebemos que estamos dentro dele quando explodimos em lágrimas ou em risos.
Aí a vida é consumada e sentida novamente.
Na palma da mão quando sentimos a pele de quem amamos; na sola do pé quando sentimos a areia molhada da praia; no prazer do alimento com os amigos; no cheiro do travesseiro quando cansados...
A vida além de bela é simples. Como o riso de uma criança, como o movimento da água no rio. Como uma semente que brota e transforma-se em flor.
A vida é uma verdadeira caixinha de surpresas, cada dia você pode abri-la e tirar de dentro o que quiser.
Pandora estava certa quando abriu a caixa que continha todos os males. A caixa está dentro de nós e abri-la para revelar o que tem dentro é realmente assustador. 
Revelar o conteúdo desta caixa para o mundo faz com que todos os minutos que vivemos sejam transformações, verdadeiramente.
Ou seremos nós que estamos dentro da caixa?
Mas o equilíbrio cósmico não nos deixa sem prumo. Não temos como fugir dele.
Na tela em branco, se não houver o sutil traço para declarar a sombra, como aparecerá a luz?
Afinal, como saberei se a estrada do céu é a melhor se não caminhar pelo inferno?

15 agosto, 2011

Subir em Árvores


Outro dia recebi um e-mail perguntando como eu tinha sobrevivido se nasci antes de 1990? Pois antigamente não existia obrigatoriedade para cintos de segurança, fiscalização de brinquedos, bebidas, enfim, essa parafernália industrial, consumista e cada vez mais paranóica que é nosso mundo. Resposta: Sobrevivi porque subi em árvores!

Você deve estar achando essa resposta sem sentido, mas, deixe-me explicar.
Sobrevivemos (e vamos pensar aqui no plural – eu, meus irmãos, amigos, etc.) porque corríamos, andávamos de bicicleta, montávamos nossos próprios brinquedos, criávamos personagens no nosso mundo real e éramos destemidos.

Nossos anjos da guarda viviam realmente ocupados enquanto o bando todo desembestava ladeira abaixo empurrando um carrinho de rolimã (quê??) ou pra escalar pedras enormes para se jogar lá de cima dentro do rio.
Assim vivemos nossa infância sem medo de ladrões, de seqüestros relâmpagos, de tarados e drogas – sem também computador, fast-food e celular.

Subir em árvores era o máximo. Simplesmente escalávamos os galhos e ficávamos lá em cima, curtindo a vista e esperando o tempo passar.
Enquanto os colegas em baixo gritavam, incentivando, subíamos achando que o mundo era nosso... E era mesmo!

Como seria hoje, subir numa árvore?
Bom, considerando que já nem se encontram árvores pra subir, se isso acontecer vai ser um grande problema. Vai ter sempre um adulto gritando – desce! Isso é perigoso! Você quer se matar menina! As crianças já crescem com alguém gritando que é incapaz. Sinceramente, não queria nascer hoje.
Sem contar que as árvores não são fiscalizadas pelo Inmetro pra saber se podem ser escaladas ou não.

E, cadê o planejamento? Primeiro, precisamos conhecer a árvore, sua origem, idade, se oferece segurança ou não. Vamos precisar de uma mochila com uma caixa de primeiros socorros, caso aconteça alguma coisa, cordas, escadas, chamar os bombeiros, fazer uma inscrição na prefeitura, tirar licença no IBAMA.

Depois vem a escalada, tudo muito seguro, dentro dos padrões de segurança, assistido pela família, com aquelas palavrinhas incentivadoras... Bota o pé aí, minha filha! Aí não! Mas como é burra, também, nunca fez isso antes! - Segura mais em cima, cuidado!

Enquanto a criança sobe, não aproveita os encantos da natureza, passa por uma formiga e não vê, não observa os detalhes do tronco, não assimila a anatomia das folhas, não percebe o ninho de pássaros, não escuta o silêncio interior, de comunhão com o belo.

Chegando lá em cima, uma saraivada de aplausos nervosos que ainda gritam – segura firme! Não vá cair!
Senta-se e olha pra baixo. Vê os rostos nervosos e nem percebe o horizonte, o que está a sua volta... Mais preocupada está na descida, afinal, como vai descer?

Esse planejamento não foi feito, mas, não tem problema, alguém vai pensar em alguma coisa. Afinal, tem tanta gente lá embaixo cuidando dela que é desnecessário preocupar-se com isso.
Infelizmente, é assim que se vive hoje. Perde-se tempo planejando demais, preocupando-se demasiadamente com estatísticas e o tempo se esvai e leva a empolgação, a euforia, a naturalidade, a alegria do momento.

Depois, quando estamos no caminho da subida, não prestamos atenção aos detalhes importantes, só no ato final. E quando finalmente chegamos ao final, já queremos desistir.
Incorporamos esses comportamentos nas relações pessoais, familiares e com nossos colegas de trabalho. Somos impessoais, irresponsáveis, superficiais e burros. Não sabem o que é subir em árvores e descobrir as joaninhas.

Para aqueles que subiram em árvores como eu, lembrem-se da felicidade genuína em viver a escalada em todos os momentos.
Nos pequenos arranhões cobertos com band-aid. Na sensação do vento no rosto, da aspereza dos galhos nos braços, os arranhões nas pernas.

Na confiança dos amigos a nossa volta, rindo e apontando a borboleta noutro galho.
E o silêncio... Ah, você se lembra do silêncio?
E na subida, para aqueles mais medrosos, alguém na frente sempre gritava, destemidamente, encorajando: “Quem chegar por último é mulher do padre!” Mulher era apenas uma palavra de encorajamento e o padre... Bom, só o víamos aos domingos.
Simplesmente a inocência era nosso combustível.
E a risada era nossa oração!

Curiosos